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sábado, 27 de novembro de 2010

Relacionamentos modernos: internet e romantismo

Pessoas têm se conhecido, construído e firmado relacionamentos amorosos on line via Internet cada vez mais freqüentemente. Muitos destes relacionamentos de fato progridem para os convencionais, tradicionais. Cientistas têm se interessado em estudá-los e estabelecer seus correlatos com a satisfação e o sucesso.

O principal aspecto peculiar dos relacionamentos on line é que eles (ainda) não apresentam normas sociais como os off line (convencionais). Muitas pessoas são neutras, mas outras têm visão negativa, acreditando que pessoas que se envolvem neste tipo de relacionamento estão "desesperadas", "em sua última alternativa para encontrar alguém" e ainda muitos associam esta prática a atitudes desviantes do comportamento.

A importância de se estudar este tipo de relacionamento reside no fato do impacto da opinião social sobre ele, determinando em grande parte a manutenção e a sustentação dele ou seu fracasso e término. Como se sabe, os relacionamentos que recebem suporte social são mais propensos a darem certo do que aqueles sem este suporte.

Alguns autores sugerem que os relacionamentos virtuais – guardadas as diferenças nos aspectos dinâmicos e temporais do seu desenvolvimento – são tão reais como os outros relacionamentos. Ademais, os relacionamentos virtuais facilitam confidências, ao permitirem que se quebrem certas limitações dos relacionamentos face-a-face, facilitando a situação para os tímidos. O anonimato facilita e acelera estas relações.

Cerca de dois terços de novos usuários da Internet desenvolvem relacionamentos interpessoais, dos quais 7,9% evoluem para relacionamentos amorosos. As mulheres são mais propensas do que os homens, mas estado civil ou idade não afetam a probabilidade de se iniciar um relacionamento interpessoal, real. Como era de se esperar, há correlação positiva entre o tempo gasto on line e a prevalência da formação de relacionamentos. Entre os adolescentes de 14 a 17 anos, cerca de um quarto dos relacionamentos on line progridem para um encontro real, off line.

Em geral, a percepção sobre relacionamentos amorosos via Internet é negativa. Indivíduos que não se envolvem em relacionamentos on line tendem a estigmatizar e a avaliar de forma muito negativa aqueles que o fazem. Costumam dizer que aqueles que se envolvem neste tipo de relacionamento são "nerds" ou "esquisitos" ou estão apenas em busca desesperada por uma relação sexual. Estas avaliações negativas sem dúvida apresentam impacto no suporte social das pessoas que praticam relacionamentos amorosos pela Internet.

A maioria das pessoas atribui aspectos negativos aos indivíduos que fazem uso da Internet com propósitos psicológicos ou sociais. O contrário ocorre quando o uso está direcionado para obtenção de informação e cultura geral.

Os autores do texto em tela elaboram três hipóteses que buscam confirmar:

Hipótese 1: Há relação positiva entre afinidade à Internet e percepção dos relacionamentos amorosos on line, de tal forma que à medida que cresce a afinidade pela Internet, as percepções dos romances on line se tornam mais positivas.

Hipótese 2: Há uma relação positiva entre a percepção do realismo da Internet e a percepção dos relacionamentos amorosos on line, de tal forma que à medida que a percepção de realismo da Internet aumenta, as percepções dos romances on line se tornam mais positivas.

Hipótese 3: Há uma relação positiva entre o tempo gasto na Internet e a percepção dos relacionamentos amorosos on line, de tal forma que à medida que o tempo gasto on line aumenta, as percepções dos romances on line se tornam mais positivas.

Na cultura ocidental, os ideais de romantismo caracterizam os relacionamentos íntimos. As crenças românticas estão relacionadas a como as pessoas percebem os relacionamentos amorosos, inclusive aqueles que ocorrem no espaço cibernético. Parece plausível imaginar que pessoas com crenças românticas fortes concebem relacionamentos on line de forma diferente daquelas sem estas crenças.

Quando a crença romântica é muito forte, pouco importa saber como é que duas pessoas estão juntas, de que forma ocorreu o encontro. Aqueles que acreditam que o "amor pode tudo", também acreditam que todos os obstáculos podem ser vencidos, inclusive os criados pelo mundo da Internet.

Os autores do texto então procuram responder a seguinte questão: Há uma relação entre crenças românticas e percepções dos relacionamentos românticos on line?

Para testarem as hipóteses e responderem à esta pergunta, os pesquisadores estudaram 177 pessoas que nunca se envolveram em relacionamentos românticos via on line. Foi aplicado um questionário que versava sobre a quantidade do uso de Internet; afinidade pela Internet; percepção de realismo da Internet e crenças românticas.

Os resultados mostraram que a hipótese 1 estava correta. Há correlação positiva entre afinidade à Internet e percepção dos relacionamentos amorosos on line (r = 0,41; p = 0,001).

A hipótese 2 de que há relação positiva entre realismo da Internet e percepção dos relacionamentos amorosos on line não foi confirmada a nível de significância de 0,05.

A hipótese 3 que predizia relação positiva entre quantidade de uso da Internet (horas por semana) e percepção dos relacionamentos amorosos on line foi confirmada (r = 0,35; p < 0,01).

A resposta à questão sobre qual a relação entre crença romântica e percepção dos relacionamentos amorosos on line mostrou que a relação é negativa (r = -0,28; p = 0,01).

A primeira hipótese confirmada é consistente com as pesquisas realizadas para avaliação da afinidade pela TV. Quanto maior a afinidade pela TV, maiores são as atitudes positivas no que se refere aos comportamentos veiculados pelos programas de televisão. Também é consistente com a pesquisa que mostra a relação entre afinidade pela Internet e uso dela para fins sociais como salas de bate-papo entre amigos ou "messenger" (comunicadores instantâneos). Além disto, este achado é intuitivo, pois  as pessoas que guardam uma visão positiva sobre a Internet estão mais abertas a aceitar relacionamentos que se iniciem por ela.

A segunda hipótese não foi confirmada. Uma possível explicação é a de que realismo não é conceitualmente consistente com informação pela Internet. A questão parece ser mais de credibilidade e confiança do que de realismo. Outra possível explicação é: o que é "real" nem sempre é "bom".

Os pesquisadores confirmaram que à medida que as crenças românticas aumentam, a percepção dos relacionamentos amorosos on line torna-se mais negativa. É possível que muitas pessoas acreditem que o desejo sexual não pode ser experimentado por alguém que não se encontrou ao vivo com outra pessoa, pois isto vai contra a crença romântica de que parte do romance é composto por atração física.

Talvez a parte mais importante deste estudo seja o achado de que a maioria das pessoas tem uma percepção negativa destes tipos de relacionamento on line. O estigma negativo social pode abalar os relacionamentos on line: medo do incomum e do desconhecido além das preocupações de segurança. Este estigma não é diferente do que sofrem os homossexuais ou aqueles que mantêm relacionamentos inter-raciais. A sobrevivência destes relacionamentos fica prejudicada pelo estigma social. Outra conseqüência é o fato do casal, muitas vezes, não revelar a forma como se encontrou, devido ao medo de represália social e isto mantém o estigma.

Outra implicação importante deste estudo é a correlação entre a quantidade do uso de Internet e a afinidade por ela com os relacionamentos amorosos on line. O incremento do uso da Internet e dos computadores prediz que a percepção dos relacionamentos amorosos on line deve se tornar mais positiva com o tempo.

A principal limitação deste estudo refere-se à amostra utilizada, a qual foi de conveniência: jovem, de origem européia ou americana, composta por colegiais não graduados e presumidamente heterossexuais. Amostra mais ampla e representativa precisa ser obtida para futuras pesquisas nesta área, inclusive composta por indivíduos de outras raças e orientação sexual, assim como deve ser elaborado um estudo mais apurado para se verificar as diferenças entre os gêneros no que se refere aos itens pesquisados.

Fonte(s):

Anderson TL. Relationships among Internet attitudes, Internet use, romantic beliefs, and perceptions of online romantic relationships. CyberPsichology & Behavior 2005; 8(6):521-31.

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